Páginas

quinta-feira, 7 de março de 2013

O CONTRABAIXO NO BRASIL

por Jorge Pescara
Copa 5 (Meireles, Vinhas, Manoel Gusmao, Dom Um  e Pedro Paulo)

Chu Viana
            Tudo começa com o contrabaixo acústico entrando nas gravações substituindo a tuba (instrumento de sopro com pistões/chaves de grandes proporções, enorme campana que produz uma sonoridade grave próxima à do contrabaixo, porém de difícil entonação e execução). A primeira gravação musical profissional, de que se tem notícia no Brasil, foi o samba “Pelo Telefone”, de Donga, onde não foi usado o contrabaixo. No Brasil o baixo elétrico foi introduzido na década de 60 substituindo gradativamente o baixo acústico, muito comum em bandas de baile, orquestras e trios de Jazz-Bossa Nova. Nesta época os baixistas mais atuantes eram Chú Viana, Sabá, Capacete, Boneca, Bandeira, Luis Chaves, Sérgio Barroso, Tião Neto, Bebeto, Azeitona, Théo de Barros, Tião Marinho, Fernando Marinho e Manuel Gusmão, todos baixistas acústicos. Houve certa resistência por parte dos músicos, porém com o passar do tempo a aceitação foi cada vez maior e o contrabaixo elétrico passou a figurar nos movimentos musicais mais importantes da época, ou seja, grandes festivais de música da TV Record, Tropicália (conceituada pela intelectualização e pelo despontar das cabeças pensantes na cultura musical brasileira), Jovem Guarda (e a junção da MPB com o Rock'n Roll), Bossa Nova (e mútua troca de influências com o Jazz norte-americano), etc. 
Tenório, Tião neto e Edson Machado
A partir daí surgem: o argentino radicado brasileiro, Willy Verdaguer de Caetano Veloso e dos “Secos & Molhados”, com sua linguagem exótica e palhetada à la Chris Squire do YES, além de Arnaldo Dias Baptista dos “Mutantes”, om o baixista Nenê do grupo Os Incríveis (também com Elis Regina e Raul Seixas), seguidos dos grupos “Tutti Frutti” do excelente baixista e compositor Lee Marcucci, “A Bolha” do baixista Arnaldo Brandão, “Casa das Máquinas”, “Joelho de Porco”, “Motto Perpetuo” com Gerso Tartini no baixo, “Made in Brasil” com o líder e contrabaixista Oswaldo Vecchiono, “A Cor do Som” com multi-instrumentista Dadi, misturando ritmos brasileiros (como o chorinho) com o rock, o grupo vocal/instrumental “Boca Livre” com o discípulo de Pastorius Maurício Maestro no baixo e Luís Fernando que acompanhou “Guilherme Arantes”, dentre muitos outros. Por outro lado, na parte da criação e idealização de instrumentos Luizão Maia, baixista acústico que migrou para uma das primeiras gerações do elétrico nacional, atesta em entrevista (revista Backstage edição nº 33, 1997, pág 57) que foi o idealisador do baixolão (baixo eletroacústico em formato de violão) quando encomendou na década de 70 um instrumento com o bojo do violão folk, mas com braço e cordas de baixo elétrico na extinta fábrica de instrumentos musicais brasileiros, Del Vecchio.
OS CONTRABAIXISTAS BRASILEIROS



Luis Chaves




Sabá
    Tão importante quanto à chegada do instrumento elétrico ao Brasil são os músicos que fizeram o nome deste instrumento na nossa música, deixando suas características marcantes na execução do baixo, seja em gravações ou apresentações ao vivo. No contrabaixo acústico podemos dizer que Manoel Luiz Lameira Viana, conhecido como Chú Viana, foi o primeiro instrumentista a tocar num estilo jazzístico e sem a preocupação de ler partitura, isto conforme descrito por Sabá (contrabaixista acústico irmão de Luis Chaves). Sabá conheceu Chú Viana em 1952. Chú Viana é apontado como influência direta ou indireta por oito em cada dez baixistas daquela época. 

Os principais grupos de samba jazz dos anos 60 eram Jongo Trio, Edson Machado Trio (Ricardo Santos), Tamba Trio (Tião Neto), Bossa Três (Bebeto), Zimbo Trio (Luis Chaves), Sambalanço Trio, Anjos do Inferno, Bando da Lua, Os Cariocas, Fórmula 7 (Luizão Maia), além de muito outros. Alberto Gordo, Newton Campos, Mathias Matos, Nilson Matta... Analisando de forma isenta, todos estes podem ser sintetizados em Sérgio Barroso, cuja técnica no acústico é impressionante. 
Luizão Maia
Na transição para o baixo elétrico os instrumentistas utilizaram uma adaptação da técnica do acústico, apresentando, até então, pouca inovação realmente representativa, porém isto veio a mudar quando o contrabaixista carioca Luizão Maia faz seu debut. Luizão colocou swing e molho nos grooves de MPB com inclusão de ghost notes nas levadas de Samba e fragmentos de condução de Jazz na música brasileira. Seu extenso trabalho em shows e gravações, principalmente os discos com Elis Regina são prova fiel deste fato. Como exemplo citamos o álbum: Elis Regina Montreux Jazz Festival, ao lado de César Camargo Mariano no piano e sintetizadores, Hélio Delmiro na guitarra, Paulo Braga na bateria e Chico Batera na percussão. O trabalho de Luizão na música “Cobra Criada”, deste mesmo disco, é um marco histórico no avanço técnico do instrumento no Brasil. Luizão trabalhou com praticamente todas as estrelas da MPB até inicio da década de 90, quando infelizmente sofreu um derrame que paralisou seu lado direito do corpo. Hoje, vivendo no Japão, Luizão faz tratamentos alternativos, sempre acompanhado de sua esposa Yoko Bekku, atuando, paralelamente, em shows de música brasileira tocando apenas com a mão esquerda batendo os dedos nas notas (algo como a técnica de tapping). Durante a transição dos anos 60 para os 70 os baixistas acústicos continuaram sua trajetória, enquanto outros migravam para o elétrico. A esta altura uma nova geração de baixistas elétricos estava nascendo no país. Seguindo os passos de Luizão surge Sizão Machado. 
Sizão Machado
Este paulistano convicto, que já atuou ao lado de Milton Nascimento, Chico Buarque de Holanda, Ivan Lins, Joyce, Batacotô, Djavan e Elis Regina, desenvolveu um verdadeiro dicionário de levadas e grooves afro-brasileiros em seus dez discos com Djavan e a banda Sururu de Capote. Todo este trabalho está sutilmente sintetizado no disco de estréia do grupo Batacotô. Merece ser citado também, Arnaldo Dias Baptista dos “Mutantes” que foi um dos primeiros na área de elétrico no Pop nacional, ao lado do irmão Cláudio César Dias Baptista ícone no desenvolvimento tecnológico de instrumentos, amplificadores, efeitos e caixas acústicas artesanais nacionais. Aliás, neste quesito, equipamentos nacionais, nos primórdios dos tempos da eletrônica tupiniquins, tiveram também os srs. artesãos Del Vecchio, Di Giorgio e Giannini, além de marcas como Begher, Phelpa, Snake, Ookpik, Finch e os artesãos de baixos acústicos e elétricos como Victorio, Benvenuti e Lucchesi. Devemos muito à eles. Paulo César Barros, conhecido como PC, baixista e cantor da banda pop “Renato e Seus Blue Caps”, admite ter sido o primeiro a trazer a técnica de Slap para o país, no início dos anos 70. Aliás, sua técnica é muito peculiar. Em suas viagens ao exterior trazia métodos e idéias novas que logo eram passadas aos colegas. Outro ilustre que pode muito bem ocupar a cadeira nº5 na “Academia Brasileira do Contrabaixo” é Alex Malheiros do grupo Azimuth. Nos anos 70 fez muito sucesso no exterior com grooves e solos com uma linguagem particular e interessante misturando o Samba-funk com o Pop e o Jazz. Sua linguagem é bem definida com muitas semicolcheias e timbre médio-agudo. A esta altura o cenário já estava tomado por dezenas de feras do contrabaixo: Moacyr Albuquerque, Rubão Sabino, Milton Botelho, Jorge Degas, Jacaré, Novelli, Dininho, Toinho, muitos dos quais podem ser conferidos em centenas de gravações espalhadas por aí. 
Cláudio Bertrami
O paulista Cláudio Bertrami é considerado um dos pioneiros no baixo fretless (sem trastes) e picolo (escala curta com cordas finas afinadas uma oitava acima do normal) no Brasil. Cláudio possuía um estilo próprio de executar música brasileira com swing e precisão no baixo sem trastes. Acometido por um derrame que paralisou seu lado esquerdo integralmente em 1986, Cláudio dedicou-se ao desenvolvimento de métodos de ensino e lecionou até falecer em 2002 na cidade de Tatuí onde residia com a família. Ficam como legado seus discos, principalmente os raríssimos discos com o grupo Medusa “Medusa” e “Ferrovias”. Finalmente outro músico que marcou época no contrabaixo brasileiro foi o saudoso Nico Assumpção que levou ao extremo a arte de grooves e solos nas 4 cordas. Nico aprimorou-se nos Estados Unidos e com seu inseparável baixo Wood de 6 cordas (instrumento artesanal brasileiro) espantou o mundo acompanhando João Bosco. 
Jamil Joanes


No final dos anos 70 veio uma safra de excelentes músicos que brilharam na década seguinte, explorando o legado deixado pelos mestres que os precederam. Citando alguns mais conhecidos: Bororó, Jamil Joanes, ambos seguindo a escola Luizão Maia, sendo que Jamil despontou para a comunidade dos contrabaixistas ao participar do super grupo Black Rio no final dos anos 70, causando verdadeiro furor com suas linhas samba-funk-soul; Luis Alves, Gabriel Balis, Bruce Henry, Zeca Assumpção, Jorge Oscar e Jorge Helder, alguns dobrando entre o elétrico e o acústico, Arthur Maia, com uma atitude mais pop no palco atraindo jovens de todas as idades com sua sonoridade Jaco Pastorius/Marcus Miller, mesclando lirismo e melodias cheias de melismas e inflexões; Celso Pixinga e seu slap mortal, com um dos melhores timbres de contrabaixo de que nosso país tem notícia, além, é claro, de multi-instrumentista Arismar do Espírito Santo e seu estilo debochado e sonoridade rascante, usando diversas técnicas inusitadas para extrair sonoridades diversas, além de Pedro Ivo, Paulo Soveral, Itamar Colaço, Itiberê Zwarg, Fernando Souza, Dárcio Ract e o mago do pizzicato André Gomes. Nos anos 80 o Brasil foi literalmente envolvido por vários grupos instrumentais, cujo principal foco principal era a fusão de estilos. Podemos exemplificar este fato citando o “Cama de Gato”, com Arthur Maia, “Medusa” de Cláudio Bertrami, “Pau Brasil”, com Rodolfo Stroeter, “Kali” da bela Ge Cortez, “High Life” de Nico Assumpção, “Zona Sul” com Celso Pixinga e “ZonaZul” de Silvio Mazzuca Jr. A década de 80 ainda apresentou outras novidades na área do pop-rock como Liminha , Dé “Barão”, Renato Roquete “Marina”, Nilo Romero “Cazuza”, Bi Ribeiro “Paralamas”, Nando Reis “Titãs”, Ricky Villas-Boas “ZERØ”, Didi Gomes “Gilberto Gil”, Scowa “Máfia” e Tavinho Fialho “Caetano Veloso”. Hoje, preferimos aguardar para que o tempo se encarregue de demonstrar, com sua linguagem imparcial e justa, aonde desaguará este brasileiro rio das cordas graves!

Gostaria de citar alguns outros baixistas que também fazem parte desta história: Adriano Giffoni, Pedro Ivo, Zeca Assumpção, Chico Gomes, Jorjão Carvalho,  Paulo Lepetit, Paulo Russo, Yuri Popoff, Zuzo Moussawer, Itamar Collaço, Itiberê Zwarg, Marcelo Mariano, Fernando Souza, Rubens Sabino, Moacir Albuquerque, Milton Botelho, Jorge Helder, Jorge Degas, Nenê, Jacaré, Décio Rocha,  Gérson Frutuoso, Alberto Gordo, Paulo César Barros PC, Maurício Maestro, Novelli, A.C., Bruce Henry, Bira Sexteto, Dunga, Prateado, Papito, Tião Marinho, Fernando Marinho, Ricardo Santos, Dininho, Toinho, Paulo Brandão, Edú Martins, Luís Fernando, Nenê de Campinas, André Neiva, André Gomes, André Rodrigues, Liminha, Lee Marcucci, Andria Busic, Didi Gomes, Rodrigo Barão Vermelho, Gilberto Pinto, Geraldo Vieira, André Vasconcelos, Ronaldo  Diamante, Paulo Brioshi, Geisan Varne, Glauco Sölter, Gilberto de Syllos, Ézio Filho, Tuca Alcântara, Max Robert, Ximba Uchiama, Scowa, Paulo Soveral, Rogério Botter Maio, Paulo Padilha, Zéli, Fernando Savaglia e... é claro,Tavinho Fialho (in memorian).
Enfim todos que contribuem pela evolução do contrabaixo nacional!

5 comentários:

  1. Ótimo blog, excelente pesquisa. Vou tomar a liberdade de complementar citando 2 baixistas que criaram um estilo calcado na música mineira, cheio de harmonia e explorando as Tensões, Novelli e Paulinho Carvalho, ambos fizeram parte do movimento Clube da Esquina. Abs

    ResponderExcluir
  2. Olá amigo tudo bem?
    Gostei muito de seu post, gostaria de saber as fontes das quais você se utilizou para tal pesquisa sobre o iniciou do contrabaixo no Brasil, estou iniciando uma pesquisa para um mestrado com um foco diferente, porém essa historia me serviria para a contextualização histórica.
    Eu ficaria imensamente agradecido se você me indicar quais foram as fontes.

    Grato.

    Thiago Dombrowski
    E-mail: Thiagowski@gmail.com

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá Thiago, obrigado por acompanhar o blog.
      Fiz uma extensa pesquisa, ao longo dos anos, conversando com músicos, produtores e jornalistas, além de ler mtos livros e pesquisar na própria internet. Procurei me certificar das informações, através das conversas citadas, antes de postar o txt.
      Abrx,

      Excluir